Crônicas

1 ano e 3 meses sem açúcar: eu não me privei. Eu me livrei.

Certa vez ouvi sobre uma oração em que agradecemos o que não se tem. Uma espécie de reverência à vida focada no que realmente importa e tendo como perspectiva a finitude.

Antes, a vida com açúcar era como se eu andasse à pé no asfalto sob um calor de quarenta graus, com uma mala gigante, pesadíssima, puxada por dedos já castigados e rodinhas que mais emperram do que rolam.

Não ter o açúcar na minha vida é como caminhar sob uma floresta respirando ar fresco, apenas com minha bolsa pequena à tiracolo.

Não tenho comprado uma porção de produtos no supermercado, esses que passam longe de ser um alimento. Não consumir esse tipo de coisa por causa do açúcar significa, também, não ingerir outras substâncias igualmente nocivas. Além de saudável, é econômico e estético, pois não enche a minha cozinha de embalagens. Se pararmos para pensar, 90% do que tem lá no supermercado não precisamos (nem devemos) consumir.

Não tenho recebido itens que talvez não use. Pois é, banir o açúcar afetou positivamente até os presentes que recebo. Sabendo que estou plantando, criando horta e me alimentando sem veneno, os mimos agora recebidos são flores, mudas, sabão feito em casa, ferramentas para a lida no sítio. Se soubesse que seria presenteada com tanta coisa preciosa teria feito essa mudança antes.

Não tenho a fadiga e a letargia que o açúcar descarrega no corpo. Tenho mais disposição. Não tenho a compulsão e o vício. Não tenho a sensação de servidão, de que “se eu não comer um doce agora, não vou conseguir tocar a vida”.

Não tenho a preocupação de acabar diabética, que tirava meu sono. Não tenho mais os 10 kg que eliminei. Não tenho a acidez e a inflamação no corpo causadas pelo açúcar e também não tenho a minha vitamina B12 sendo roubada por ele. Não tenho que fazer ressonância de 6 em 6 meses. Agora é a cada 2 anos.

Não tenho mais essa meta por alcançar, pois vinha há anos tentando mudar meus hábitos alimentares sem sucesso. Não tenho mais a frustração de não conseguir. Não tenho mais a cobrança, o diálogo difícil comigo mesma pois consegui virar essa página. Não tenho mais a autocrítica constante e o pensamento circular que tanto faziam mal ao meu bem-estar mental.

Não tenho a sensação de não estar no controle da minha vida, dela não ter governo. Toda hora aparecia uma ocasião para comer açúcar e, depois que a moleza se instalava, culpava mentalmente terceiros que “me fizeram” comer o doce. Culpava quem fez a festinha, quem insistiu para eu repetir, quem levou aquele pedaço de doce açucarado na minha casa. Não tenho mais uma venda nos olhos.

Não tenho mais a desinformação.

E falando em desinformação, indico alguns livros muito interessantes que podem ajudar você no caminho da libertação do consumo dessa droga. Lembram do Tim Maia dizendo que não queria mais cocaína, que só queria saber de chocolate?

O esclarecedor Sugar Blues, do William Dufty, que indiquei quando completei 5 meses sem açúcar, conta exatamente a história do refinado, sobre como ele deixou de ser chamado de droga (apenas chamado, porque deixar de ser uma droga nunca deixou), para se tornar a base da nossa alimentação, do acordar ao adormecer (mamadeiras açucaradas que o diga).

O bem-humorado Sem açúcar, com + afeto, da Sonia Hirsh. Mesmo que você não tenha interesse em parar de ingerir açúcar, a leitura vale pelo bom humor com que ela escreve – e pelas 75 receitas de doces. O texto é leve, a leitura flui sem a gente perceber e a quantidade de informação útil que levamos para a vida, essa sim, é uma bagagem que vale a pena carregar.

O essencial Mude seus horários, mude sua vida, do médico indiano ayurvédico Suhas Kshirsagar, foi um grande mentor para a mudança dos meus hábitos alimentares. Ele explica como é importante voltarmos a nos conectar com os ritmos circadianos, que cada célula do nosso corpo tem um relojinho e um horário certo para funcionar. Apenas parando de comer açúcar eu perdi cinco quilos. Dos outros cinco eu me livrei ainda no processo de retirada do açúcar e aliado a essas adaptações de horários e quantidades.

São tantos elementos que não tenho mais que a vida ficou mais leve. E de quebra, não tenho mais um lugar na engrenagem feita pra gente fazer a indústria da comida enriquecer. E depois de adoecermos, fazer a fortuna da indústria do remédio.

Não ter mais essa mala sem alça e pesada durante a minha caminhada, que eu nem pedi pra carregar, é de juntar as mãos e agradecer mesmo.

Fotos e texto de minha autoria, Juciéli Botton, para a Casa Baunilha.

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