Meu varal de taquara é um sonho que virou realidade não somente pelo varal em si, mas também pelo que representa. Quem já teve um varal portátil no meio da sala do apartamento de 46 m2, assistindo a panos de prato secarem durante longos 4 dias, em tempo bom, e em 7 dias em período chuvoso, sabe do que estou falando. Aquele casaco pesadão, então, é melhor lavar no verão para estar seco e pronto pro uso no inverno.
Secar roupa dentro de apartamento, em prédio rodeado por outros prédios, onde não corre vento, forma caráter. A gente ainda desenvolve uma paciência de Jó – eu nasci com a minha, então ela só ficou mais dura que granito. A gente também obtém título de PhD em determinação. E a gente nunca mais vai deixar de usar os varaizinhos portáteis.
Por quê? Porque a roupa íntima a gente estende de forma discreta entre o pé de araçá e a oliveira, já que as peças no varal de taquara ficam expostas. E quando o tempo muda de repente, é no varal portátil dentro de casa que a roupa vai terminar de secar.
E as roupas no varal de taquara avoam com o vento… A taquara vai pra lá, vai pra cá… e as toalhas, o pijami (como diria minha avó) e os panos de prato vão dançando ao sabor do vento. Avoando. É a coisa mais linda de se ver.
Quando levantei a taquara e apoiei no chão, com o peso do varal cheio, parecia uma conquistadora de território depois da guerra cravando a bandeira no chão. Parecia não, eu era a própria. Depois de 8 anos de peleia procurando um lar pra secar minhas roupas ao Sol e ao vento, só faltou o hino. Foi um momento tão emocionante que peguei o chimarrão e sentei para ficar contemplando.
E fotos e mais fotos desse momento sublime, é claro.
Ai, meu varal de taquara.
Qual foi a ideia aqui: reaproveitar os mourões de concreto que retiramos lá da frente da casa, quando reformamos o muro da calçada. Eles ficaram sobrando e guardei pensando no futuro varal. Como a parte superior deles é inclinada, coloquei 2 mourões em cada ponta do varal, de costas um para o outro para haver uma distância entre as cordas. No projeto original, pensei em amarrar 2 cordas em cada lado. Mas foi melhor começar com apenas uma em cada para ver como o varal se comporta.
A taquara foi posicionada no meio do fio mais alto. Depois vou acrescentar a segunda taquara no mesmo fio e outra no mais baixo. A taquara é fundamental para esticar e elevar o fio que pesa com as roupas molhadas. A altura fica perfeita para estender lençóis e outras peças compridas.
Aconteceu algo sensacional durante a produção. Na área rural da cidade, onde há o taquaral de onde pegamos as taquaras, estacionamos longe por causa da lama. No caminho de volta ao carro olhei para trás e vi o início de um arco-íris saindo do taquaral, subindo em direção à nuvem logo acima que ficou cor-de-rosa. Só que até chegarmos no carro, onde estava o celular, as cores já tinham dissipado bastante. Mas ainda podemos ver, na foto da esquerda, uma faixa colorida saindo dos grandes arbustos verdes ao final da estrada e a nuvem clara logo acima, ainda um pouco rosada. Foi especial. Na foto da direita, a serrinha que usei para fazer os cortes.
Cortei a taquara bem perto do nó. Se cortar mais longe, cria uma espécie de copo muito profundo onde a água da chuva acumula e leva ao apodrecimento mais rápido. Também fiz um vinco para encaixar o fio do varal. O acabamento ficou por conta da abraçadeira para impedir que a taquara abra até embaixo, caso comece a rachar no sentido das fibras.
Na ponta que fica em contato com o solo repeti os processos do corte perto do nó e da abraçadeira. Não é necessário fazer o vinco.
Roupas secando ao ar livre é uma das tantas cenas e elementos que representam uma casa brasileira, as casas dos nossos avós. Só que hoje a moda é esconder as roupas que estão por secar. Da mesma forma que antigamente a cozinha ficava escondida pois era tida como um lugar menos nobre, onde as visitas e os donos da casa não poderiam estar. Hoje a cozinha é a estrela das moradias, o lugar, por vezes, mais aconchegante de todo o imóvel.
A questão das roupas secando ao vento e sob o Sol tem conexão com o resgate do que é importante pra nós, do que nos faz saudáveis e da utilização de recursos gratuitos. O vento é um recurso natural e gratuito e as roupas secam mais rápido em dia de vento do que quando se tem apenas o Sol. E o que dizer desse astro? A nossa fonte primária de energia e o sanitizante natural e gratuito de que dispomos.
Na minha longa jornada em busca de uma casa, ou já construída ou que eu pudesse construir sobre um terreno, a referência sempre foi esse jeito de casa de vó, com as características que compõem o imaginário coletivo sobre o que uma casa brasileira tem. E quando eu digo “casa de vó” é pura e simplesmente porque é um design de casa que praticamente não se constrói mais. Por isso são casas que existiram e que marcaram a geração dos nossos avós. Nossos pais, se não continuaram morando na casa dos avós, construíram casas um pouco mais ligadas nas tendências contemporâneas a eles. E as moradias que são construídas hoje, para a nova geração, sinceramente, não vejo tanta diferença entre elas e uma clínica. Ou um banco.
É claro que cada pessoa tem o direito de criar seu lar doce lar conforme quiser e puder. Eu já sonhei com um apartamento em estilo industrial. Mas ainda bem que existem duas coisas chamadas vivência e amadurecimento. Quando não temos as informações corretas e os princípios básicos sobre o tema, fica fácil embarcar nos modismos. Mas ainda bem que pra tudo há um jeito. Independentemente do design, depois de munidos de informação podemos modificar nossos lares para que fiquem aconchegantes e saudáveis.
A casa é a nossa terceira pele e o entorno dela é a quarta. A gente precisa conduzi-la de forma que nos ajude a viver da melhor forma possível. E isso passa, também, por valores. O que você valoriza?
Olha o que o varal de taquara é capaz de fazer. Era um simples post sobre um modelo de varal e virou uma reflexão sobre jeitos de habitar.
Ai meu varal de taquara…
Fotos e texto de minha autoria, Juciéli Botton, para a Casa Baunilha.