Por aí,  Rio de Janeiro

O décor da Confeitaria Colombo: um caso de amor antigo

 

Todo mundo tem um lugar que admira e adora mesmo sem nunca ter ido. Pois umas das confeitarias mais tradicionais e deslumbrantes do Brasil era um dos meus. Na verdade, ela continua sendo, mesmo depois de encontrar pessoalmente essa velha amiga que conheci pela internet. Bom, um espaço que une gostosuras pra comer a uma decoração histórica de encher os olhos, que acelera o coração e lota o cartão de memória da minha máquina só pode ser um dos mais queridos, mesmo.

 

 

Pelo que li por aí, a Confeitaria Colombo foi fundada em 1894 por imigrantes portugueses e recebeu este nome para homenagear o grande navegador Cristóvão Colombo. Isso explica alguns detalhes do interior da confeitaria, como pinturas em painéis, desenhos em vitrais e convites com ilustrações de caravelas e navegações. Decorada em estilo art nouveau, a confeitaria é a prova viva do que foi a belle époque carioca do período de capital da República. Ela é um bem tombado do estado do Rio de Janeiro, considerada patrimônio cultural e artístico carioca e integra o chamado Circuito dos Negócios Tradicionais do Rio. E ainda tem mais: já foi eleita um dos dez mais belos cafés do mundo.

Nunca vou esquecer do gerente. Cheguei, fiquei com aquele olhar de perdida, de Alice rodeada de maravilhas, e perguntei pra ele posso fotografar?, e ele prontamente se eu fosse tu começava agora, que tem menos movimento! Ele não falou tu, isso foi por minha conta, mas ele disse tudo que eu queria ouvir! ♥

E lá fui eu, começando pelas cristaleiras da vovó. Qual é o nome que se usa para móveis que vão do chão ao teto em vidro e madeira nobre, que guardam as louças preciosas que já serviram imperadores e também a rainha da Inglaterra, a Beth, que não seja “cristaleira”? Vitrines colossais, serve?

Enfim, essas cristaleiras gigantes guardam relíquias, antiguidades valiosas como louças, baixelas, embalagens de produtos da própria confeitaria, além de fotografias.

 

 

Eu sou a louca das louças e também a louca dos vidros. Adoro vidros. Adorei a garrafa marrom ali em cima, super trabalhada nos arabescos.

 

Então, como podem ver, as louças vão até onde a vista não alcança, porque a história da confeitaria é comprida e a cristaleira vai para o infinito e além! Notem as várias taças lá em cima, bem no alto, e notem também que eu não consigo enquadrar tudo, mesmo querendo muito. Pela foto de baixo podemos ter uma noção melhor do que eu digo.

 

E nem só de louças e vidros vive o pequeno museu que recepciona os clientes. Há muitas latas, lindas e maravilhosas, com ilustrações incríveis, que embalavam os produtos da confeitaria numa época distante.

 

Sou fã da escolha de cores desta lata. O amarelo é um pouco alaranjado, as folhas num verde alegre, o azul royal… Bem no centro da tampa, onde era para estar dourado, tem a marca Colombo. Na lateral da lata, um padrão que intercala laranjinhas e folhas. Muito fofa! Ficar analisando esses detalhes é um prato cheio pra qualquer diretora de arte e designer gráfica, não consigo evitar.

 

Eu simplesmente gamei nesta lata redonda dos biscoitos Champagne. Muito fizemos torta de bolacha na casa dos meus pais com este formato de biscoito. Muito nostálgico. As flores e as taças ilustradas… que charme essa lata!

Nesta, o símbolo da confeitaria aparece junto a flores, azevinhos e sinos. Ou seja, uma lata com temática natalina. E um amarelo de fundo que é uma loucura! Parecia ser um padrão da marca naquela época, apresentar na tampa desenhos mais elaborados e, na lateral, um padrão mais simples na sua repetição.

 

Mais cores deslumbrantes de tão vivas. E flores. Se você compra uma lata hoje, provavelmente ela terá algum desenho em estilo de pictograma, com ícones preguiçosamente replicados e rebatidos. Difícil encontrar belas ilustrações como essas nos dias de hoje.

 

As cadeiras de madeira, têm assentos e encostos na famosa textura em palhinha trançada. Teto totalmente trabalhado, com uma luminária em cada recuo. Enormes espelhos de cristal, trazidos da Antuérpia (na Bélgica), um dos maiores lapidadores de diamante do mundo, todos com moldura entalhada em madeira de Jacarandá. Os móveis foram criados pelo designer artesão Antônio Borsoi, também responsável pelo Cinema Íris do Rio. E todos os espelhos são intercalados com luminárias de parede. Ao fundo, a cristaleira mór, mãe de todas, recheada de louças históricas. Dá pra ver também um grande espelho ao centro (detalhe na próxima foto) e, acima, dele, uma pintura em vivos tons de azul representando as navegações.

 

 

Aqui está a pintura, posicionada neste grande painel em madeira entalhada, e que acomoda, ainda, um relógio. Quando você acha que já viu todos os detalhes…

 

A claraboia é um símbolo da confeitaria. Seus vitrais apresentam flores, folhas e anjos, completamente dentro do estilo de traço da art nouveau. Eu dei zoom na minha foto original e conferi. É verdade, é tudo art nouveau.

 

Já pisaram neste chão de ladrilho hidráulico: Chiquinha Gonzaga, Villa Lobos, Getúlio Vargas, Juscelino Kubitschek, Olavo Bilac, Rainha Elizabeth II. Só citando alguns.

 

Não me diga ai, tudo descascado, que horror! Diga olha só, a confeitaria é uma linda senhora de mais de cento e vinte anos, com todo o charme da passagem do tempo!

 

 

Eu simplesmente adoro o tipo de estética de bar. A fusão de vidros de todas as cores com o brilho e o reflexo dos espelhos, combinada a uma boa iluminação… moraria. Moraria em um bar. Não pela bebida pois, como vocês já repararam, a decoração é, definitivamente, a minha cachaça.

 

Nesta foto mais afastada, podemos ver melhor as garrafas do bar expostas nesta grande cristaleira e reparem que, ao lado, seguem os grandes espelhos que alcançam a mesma altura que a cristaleira do bar. Tudo tem simetria na confeitaria, o que tem de um lado, tem do outro, as alturas dos móveis, as texturas de pedra e madeira, tudo muito coerente na estética. Na pedra rosa do balcão, como se não bastassem as linhas gravadas nela, mais escuras, ainda tem mais os contornos em metal dourado. Não é à toa que o barman está ali, babando por esse lugar. Ou ele estava só olhando para o mezanino, mesmo.

 

 

Eu sei que quindim não é novidade pra muitas pessoas, mas meu doce preferido não podia não ganhar um clique. A novidade é que eu não comi! Experimentei outros doces divinos e deixei o quindim ser a minha isca pra voltar lá.

 

Abri os trabalhos com um chá, o que jamais seria diferente. Não poderia deixar de degustar a minha bebida desde a infância nessa loucura de lugar – uma jarrinha servia 4 xícaras. E com um salgado folheado, quentinho, recheado com frango desfiado. As camadas da massa eram muito crocantes. Ele era muito novinho. Quando um lugar se propõe a servir folheado, é assim que ele deve chegar à mesa, quentinho e crocante. Só isso.

 

Docinhos: Eu fui para a confeitaria com um doce em mente que eu sabia que existia ali, só que já tinha acabado lá na hora. Como ele era feito de ovos moles ♥, segui pelo mesmo caminho e escolhi um ninho de fios de ovos, que era simplesmente o paraíso. Macio, molhadinho, novíssimo. E um pastel de nata que era uma loucura total. Um grande salve ao fato de terem sido imigrantes portugueses que construíram esse espaço, para então oferecerem uma variedade de doces com ovos. Obrigada, obrigada e obrigada!

Há vários salões na Confeitaria Colombo em que se comemoram até casamentos. Mas, normalmente, os espaços que ficam abertos à circulação são o primeiro e o segundo pisos. No segundo piso, que se estrutura como um mezanino – e que você acessa por um elevador tão velhinho quanto a confeitaria -, é servido um buffet de chá. Sinceramente, não vi vantagens. As grandes delícias estão lá embaixo. Mas, nem por isso, um espaço menos suntuoso. Tenho provas…

 

 

 

 

No segundo piso também tem um pouco da memória da confeitaria, num espaço que guarda pecas históricas como embalagens, louças e convites.

 

O que são as cores e os desenhos desta pequenina lata? A borboleta? E interessante a escolha do fundo em preto para realçar tudo. Adorei esse contraste.

 

Linda demais a ilustração desta singela “homenagem” de 1922. Os detalhes, as caravelas, o preenchimento com várias texturas de traços.

 

Segundo este moço gentil, que parou seu trabalho pra contar um pouco da história da confeitaria, este piano já foi tocado por Chiquinha Gonzaga. Adorei os objetos que estão em cima do piano, parece que estamos numa novela de época, com candelabros, vasos de prata…

 

Mais referências às navegações, como este vitral do segundo piso.

 

 

 

Banheiro? Sim, ali ao fundo.

 

O banheiro, apesar do aspecto renovado, com os azulejos em estilo metrô, muito usados hoje, manteve o perfume de época com espelhos e luminárias em metais trabalhados com arabescos e cúpulas de vidro que remetem a flores. As portas lembram janelas venezianas.

 

 

A porta de entrada ainda parece ser original, e é igual à do banheiro dos homens, em estilo saloon. Reparem o entalhe dela no lado externo, na foto ali de baixo – e na minha emoção que acaba entortando as fotos.

 

 

 

Não existe confeitaria sem público. E a Colombo está sempre esperando o próximo que vai conhecê-la pela primeira vez, ou o que vai voltar como todos os dias, ou o que chega e nem repara muito nela, ou aquele que vai e se apaixona a cada vez.

Ela já viu de tudo.

 

Fotos e texto: Juciéli Botton para Casa Baunilha

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