Florianópolis,  Por aí

A exuberante trilha de Naufragados no sul da ilha de Florianópolis

Sou muito grata por ter conversado com o Antônio Luis, morador da Praia da Armação, que me sugeriu fazer a trilha para a Praia de Naufragados, ao sul da ilha de Florianópolis, em Santa Catarina. Foi uma experiência sensacional.

Ela tem uma atmosfera incrível, que faz a gente se sentir dentro de uma floresta mesmo e tomar consciência da nossa pequenez diante da grandiosidade da natureza. Nem todas as trilhas provocam esse tipo de sensação, por mais que atravessem áreas de mata.

Há árvores gigantescas. Encontrei uma que achei ser a sumaúma porque a base do tronco parecia uma parede de tão alta e larga. Mas comparada com as sumaúmas que existem por aí e que só vi por fotografias, ela devia estar na infância. Além do verde ímpar, a umidade reina por lá.

O percurso não sobe morros altíssimos e nem há a necessidade de escalarmos rochas, nada com esse nível de dificuldade. A trilha tem, sim, trechos íngremes que requerem bastante esforço físico e, ainda por cima, sobre pedras úmidas e com limo. Eu, que tenho problema no joelho, sinto bastante porque ele precisa compensar as viradas de pé para um lado e para o outro, conforme tentamos encaixar o passo entre as rochas. São poucos os trechos de chão batido e plano.

Passamos por alguns riachos e também pelas ruínas de um antigo moinho de cana e trigo, construído em pedra. Há duas áreas curvas nas rochas onde funcionavam os fornos. Quem nos contou isso foi o Ricardo, do restaurante da beira da praia de Naufragados, pois todas as placas explicativas do percurso estavam pichadas. Uma pena.

O começo da trilha fica no estacionamento dela, ao final da Rodovia Baldicero Filomeno. R$20,00 para carros e mais barato para motos. Há banheiros. Quem cuida do espaço é um casal muito simpático, também vindos do Rio Grande do Sul. Inclusive, prometi levar um pacote de erva-mate para eles na próxima vez.

O trecho inicial fica exposto a céu aberto. Por isso é bom evitar começar a trilha em horários de sol a pino, como foi o nosso caso – com apenas dois minutos de esforço me senti como se já tivesse percorrido todo o caminho, eu estava em frangalhos e mal tinha começado.

Nós saímos de Pântano do Sul, no sul da ilha de Florianópolis, e escolhemos percorrer a Estrada Francisco Thomas dos Santos para chegar ao início da trilha. A gente queria muito conhecer esse caminho e foi surpreendente. Trechos de estrada de chão, paisagens bucólicas, fazendas, alambiques, uma vista mais linda do que a outra. Uma, inclusive, mostra a Lagoa do Peri e a Praia da Armação, juntas. Foi como descobrir a roça da praia.

Um detalhe importante

Nosso plano era almoçar no Ribeirão da Ilha antes de fazermos a trilha. Só que o final da estrada que mencionei se dá após a concentração de restaurantes do Ribeirão e a gente não atentou para isso. Continuamos andando atrás de um lugar para comer enquanto os restaurantes se afastavam cada vez mais. Final da história: chegamos no estacionamento da trilha e não havia um bar aberto sequer. Até o “bar da trilha” no próprio estacionamento estava fechado. Voltar ao Ribeirão não era uma opção.

Nos atracamos em absolutamente tudo que tínhamos na mochila – bolachas, castanhas – e fomos. Embora tenha ocorrido tudo bem, foi imprudente fazer tamanho esforço numa trilha desconhecida sem termos nos alimentado direito. É importante se programar quanto a isso. A gente poderia ter comido em casa, antes de sair, ou em algum restaurante próximo à hospedagem. Ou, ainda, levar nosso lanche.

Era início de março, talvez o motivo para não haver oferta de refeição perto da trilha.

Outra questão importante

Depois da minha experiência na trilha de Naufragados lembrei das pesquisas que fiz sobre as trilhas da região e fiquei impressionada: geralmente os comentários na internet classificam todas como muito fáceis de se fazer. Para a de Naufragados as pessoas ainda dizem que é tranquila para levar crianças. Eu não concordo. Todo cuidado é pouco e os pequenos podem cansar rápido e até se machucar. E se você tiver que carregá-los, ficará tudo mais difícil.

Cada um sabe de si e dos seus, mas acho que vale o alerta. Em se tratando de trilhas, a gente precisa pesquisar bem, conversar com moradores locais, talvez até percorrer pela primeira vez sem a família toda e, dependendo do que achar, levar no segundo passeio as crianças, os idosos. Vale o cuidado para evitar que uma experiência maravilhosa se torne um pesadelo.

Você também pode chegar a Naufragados (e retornar) de barco. Como fomos para fazer a trilha, não pesquisei sobre os barcos, mas sei que eles saem do mesmo ponto onde fica o estacionamento e que, dependendo das condições do mar e do tempo, esse serviço pode ser temporariamente suspenso.

Trecho próximo ao começo da trilha, olhando para trás. Podemos avistar as águas do “Saco da Caieira da Barra do Sul” ficando distantes.

Os saguis nos observam em silêncio do alto das árvores. Sorte de quem olhar para cima. Aliás, nós iniciamos o percurso de retorno da trilha pouco depois das 17h, e notamos maior movimentação de animais porque começava a escurecer no interior da mata. Alguns pareciam roedores, mas bem corpulentos, lembrando as capivaras. Chegamos a parar um momento para eu filmar, mas apenas para registrar os ruídos pois não se via nada. Identificamos oito animais diferentes, cantando, uivando, gritando. Deu uma certa aflição. Imagina mais tarde ainda, quando mais escuro.

Há muita beleza pela qual podemos passar sem perceber.

Eu quis registrar a construção antiga mas a árvore gigante virou a protagonista, fazendo da gente um povo miúdo. À esquerda e mais acima, a árvore de tronco claro é um araçá. Há muitos dele ao longo do caminho e alguns gigantes, de troncos bem grossos. Eu adoro araçá, por isso identifico onde eles estão em todo lugar que eu vou e admiro o quanto eles conseguem crescer. Em Porto Alegre, onde moro, há muitos nas calçadas mas não chegam a se desenvolver na sua plenitude. Por isso fico admirada com os grandes araçás que encontro por aí.

Ao fundo, o tronco de uma árvore com grande área coberta pelo líquen alaranjado, um indicativo certeiro da pureza do ar.

A árvore que, se não for a sumaúma, é a irmã gêmea dela.

Trecho íngreme e com “acabamento” em rochas úmidas, que fazem a trilha ser bem demarcada. À esquerda, podemos ver um caminho alternativo. Eu contei em torno de cinco bifurcações ao longo do trajeto, se não me falha a memória. Todas são curtas e voltam para o caminho principal. É só para deixar a gente nervoso. Às vezes o atalho é melhor pois pode te poupar de uma torção no tornozelo. Mas trilha exige muito do feeling de cada um. Cada um sabe onde deve pisar, por onde deve passar.

Eu sou aquela pessoa que vê uma bromélia empoleirada no galho da árvore e grita: olha! E tira foto, muitas fotos. E pede para o marido ficar ao lado para sair junto. Encontrar essas senhoras bromélias e, ainda por cima, floridas, é um evento.

Eu disse: é um evento.

Na Praia de Naufragados, os costões de pedra chamam a atenção. As rochas já são incríveis e ainda tem a vegetação que se desenvolve sobre elas, com uma grande quantidade de bromélias. Em uma próxima publicação eu compartilharei mais informações sobre a praia.

Essa trilha foi muito especial para nós. Foi a primeira de duração considerável que fizemos, em uma área de mata densa e imensa, sendo que nós não éramos trilheiros até então. Pelo contrário, sedentários. Por isso me esbafori no primeiro minuto de trilha sob o sol escaldante do meio dia. Uma experiência e tanto pois foi um aprendizado, de muitos detalhes. De como agir, de superação, inclusive de alguns pavores, de tantos outros aspectos da vida. Quero trilhá-la novamente, pois tenho certeza de que será uma primeira vez de novo.

É como aquela história de não cruzarmos o mesmo rio duas vezes.

Confira, também, a publicação especial sobre o sul da ilha de Florianópolis, clicando aqui.

Fotos e texto de minha autoria, Juciéli Botton, para a Casa Baunilha.

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