SÍTIO

Cão caipira na cidade: os 3 maiores desafios que enfrentei

O Rogerinho é tão fácil de lidar que fez parecer normal, de repente, um cachorro que viveu a vida toda livre entre sítios, ficar confinado em um apartamento com menos de 50 metros quadrados, sem sacada. Ele é tão tranquilo que às vezes esquecemos do tamanho absurdo que foi, para ele, essa mudança. Não foi sempre fácil para nós mas, com certeza, foi muito mais difícil para ele.

Ficamos 30 dias com nosso hóspede mais que especial. Meu sogro e seu ajudante se recuperaram antes disso, para o alívio e alegria de todos, mas não quisemos levar o Rogerinho de volta de imediato, sem ter certeza da situação, se as idas deles até o sítio eram garantidas e estáveis. E juntou com isso o inverno rigoroso que estávamos tendo, com bastante chuva, vendavais e baixíssimas temperaturas.

Mas nunca foi minha intenção que ele morasse aqui. Na verdade, nunca quis confinar cachorro nenhum no meu apartamento, embora sempre tivesse vontade de ter um. E no caso do Rogerinho, também em respeito a ele e à história dele com as outras pessoas do sítio, o senhor que leva comida e o meu sogro.

O balanço desses 30 dias do nosso cachorro do sítio vivendo conosco aqui em Porto Alegre é mais do que positivo e o mérito é todo dele, do Rogerinho. Ele sempre foi um cão educado, mas eu não sabia que, além disso, era resiliente. Eu não tenho nada do que reclamar, ele é simplesmente um cachorro fora de série.

E apesar desse comportamento nota 10 dele, enfrentamos alguns desafios, dentre eles, 3 que considerei os mais problemáticos.

Lá no sítio, as cercas não o detém e delimitar território é basicamente seu propósito de vida. Este fator foi um dos desafios que enfrentamos com ele, o parar de obstáculo vertical em obstáculo vertical para deixar sua marca. Ao ponto de levantar a pata e não sair nada. Quando estávamos com pressa, tínhamos de arrastá-lo, porque senão ficaria horas farejando e mijando, e nós temos trabalho para fazer, horários para cumprir.

As ciscadas na terra e na grama – também parte da exibição de dominância aos olhos dos outros cães – eu percebi que eram mais fortes aqui do que no sítio. Aqui ele parece que usava uma força sobrenatural, a ponto de tapar uma calçada com pedaços de grama e terra que voavam. Eu deveria ter saído com uma vassoura para os passeios.

A segunda questão que enfrentamos, bem mais difícil, inclusive, foi não poder sair sem ele, tendo que levá-lo a todos os lugares. Ele nunca ficou trancado numa “caixa”, não sabíamos se acabaria fazendo as necessidades no apê por vingança, se ficaria latindo sem parar, incomodando os vizinhos, além do estresse todo que ele sofreria por não saber o que estava acontecendo. Então, sair com ele para todos os lugares foi o único jeito.

E nessa de nunca deixarmos ele em casa, tínhamos que nos dividir. Sempre um de nós ficava com ele no estacionamento e o outro ia fazer as compras, ou exames, ou vacinar contra a Covid-19, e só, que é o que se faz na pandemia.

Não podíamos entrar com ele nem nas lojas de artigos para animais. Por mais que os funcionários estejam acostumados e que o estabelecimento permita a entrada deles, é uma mijadeira sem fim quando se trata de um animal tão territorialista como o Rogerinho. E também porque ele é invocado, arranja briga com todos os machos. Pense no maior e mais feroz cão de que você tem registro. É para ele que Rogerinho vai querer dizer “esses são os meus donos e o meu espaço, vaza!” – dizem que um cão grande matou outro cão lá para os lados do sítio e que, desde então, o Rogerinho enfrenta esse tipo de cachorro. Sabe como é, lendas caninas.

A terceira e pior questão de todas que enfrentamos com o cão da roça na cidade foi ter consciência do potencial dele para correr, percorrer, demarcar, pular, torrar no sol, roer galhinhos de árvore, brincadeira que ele adora e, em vez disso, vê-lo ficar deitado o dia todo, em um dos apartamentos mais frios de Porto Alegre. Ver seus olhinhos nos observando a cada movimento que fazíamos porque somos a única coisa viva para onde olhar e com a qual se entreter era muito triste.

E assim voltamos ao ponto em que eu nunca quis confinar cachorros no meu apê, e que só estava fazendo isso com o Rogerinho em caráter de emergência.

Educado, calmo, alegre, companheiro e, ainda por cima, sempre esperou sair para fazer as necessidades. Não latia para nada dentro do apê e aprendeu rápido algumas regrinhas básicas que estabelecemos para o bom convívio de todos, sobre as quais posso contar num próximo post.

Adoramos passar esse tempo com ele. Tomara que, apesar da prisão e das mudanças bruscas, ele tenha gostado também.

Foto e texto de minha autoria, Juciéli Botton, para a Casa Baunilha.

Um Comentário

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *