Faz tanto tempo que quero escrever sobre isso. Desde os meus, talvez, sete anos. Pois é, eu sei, uma menina, no início dos anos noventa, não pensaria que precisa exorcizar um problema escrevendo publicamente sobre ele. Mas digamos que sim porque na tenra idade eu já me sentia muito incomodada com isso.
Era a festa do meu aniversário e meu pai tinha uma filmadora portátil que generosamente me deixava manusear. Lá pelas tantas, tive a brilhante – e, mais tarde, revelando-se fatídica – ideia de pedir aos convidados que dissessem uma mensagem à aniversariante, gravada por mim, claro.
O primeiro convidado disse que eu era uma menina muito linda. O segundo falou da minha beleza. O terceiro contou que me achava muito bonita. O quarto: “ela é linda”. E assim por diante.
Visualizem uma criança, um ser com ralos conhecimentos de vida, entristecida com elogios como esses, uníssonos, a ponto de uma adulta nunca ter esquecido. As crianças percebem e sentem, sim. E algumas experiências conseguem se perpetuar nas caixas pretas do nosso inconsciente porque também são reforçadas por novas, reunindo e calcificando as tristezas por semelhança.